quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

O CASO FREEPORT


FOCUS 485

Depois de três anos de quase silêncio, o “caso Freeport” regressou aos noticiários e não é preciso ser bruxo para adivinhar que ele vai continuar ainda por uns tempos (na melhor das hipóteses) a incomodar José Sócrates. O primeiro-ministro percebeu muito bem que o “caso” tem os todos combustíveis para acender uma fogueira que o pode queimar, em lume brando ou rápido. Por isso, desta vez – e ao contrário do que aconteceu com o caso do curso na Universidade Independente – veio a público fazer sucessivas declarações que foram aumentando de tamanho e de solenidade. 

É claro que cabe à investigação e à justiça esclarecer o mais rapidamente possível se houve alguma coisa de inaceitável no comportamento de Sócrates quando era ministro do Ambiente. No entretanto, tem, como qualquer cidadão, direito à presunção de inocência. Mas isso não quer dizer que o impacto politico-mediático que o caso já teve e vai continuar a ter não lhe cause graves e perduráveis danos. Ele tem consciência disso e está a tentar limitá-los, com uma determinação e um sangue frio que são alguns dos traços mais eficazes do seu temperamento político.

A expectativa é grande sobre o que o “caso” ainda vai dar. E basta lermos os comentários ininterruptos que circulam na net para percebermos que este é daqueles que excitam a opinião pública e motivam conversas, anedotas, suspeitas e indignações. Contudo, enquanto esperamos para saber mais, é possível, desde já, fazer alguns reparos sobre aspectos inadmissíveis que o “caso” revela.

O primeiro é que tem de se acabar com a prática seguida por todos os governos de, quando estão nos últimos dias dos seus mandatos, despacharem, com uma sofreguidão suspeita ou uma pressa leviana, assuntos melindrosos, tomando decisões que os governos seguintes herdam. Este mau hábito cria um clima deletério e representa um repetido ataque à credibilidade da democracia e dos seus agentes.

O segundo é que a violação do segredo de justiça continua a fazer-se impunemente e muitas vezes os seus fautores são aqueles a quem mais compete respeitar e fazer respeitar a lei. As notícias que saíram sobre buscas, gravações, declarações que constam do processo do “caso Freeport”, que está em segredo de justiça, assentam em violações claras desse segredo e configuram interesses ocultos, múltiplos e coincidentes, que, por essa via, prosseguem objectivos inconfessáveis.

O terceiro reparo é que os magistrados continuam a considerar-se acima da crítica. Há muitas coisas erradas na justiça e algumas delas são da responsabilidade dos seus agentes. É assim salutar que sejam criticados. E o ar de virgens ofendidas ou de vítimas indefesas com que sempre aparecem não chega para nos convencer de que não há muita coisa que tem de ser mudada nos seus comportamentos e atitudes.

O quarto reparo é que não se percebe que o Presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público venha permanentemente fazer declarações institucionais quando se deve limitar a tratar de temas e reivindicações laborais e corporativos. Quem representa institucionalmente o Ministério Público é o Procurador-Geral da República e não o Presidente do Sindicato.

Tudo visto e avaliado, forçoso é concluir que José Sócrates vai ter pela frente um ano eleitoral duríssimo: a crise que cada dia se agrava, as investidas de Manuel Alegre, o caso Freeport e o mais que virá. Vai assim precisar de muita resistência para chegar às eleições em condições de as vencer e de as vencer bem. Isto é, com maioria absoluta. Enquanto as dúvidas e as incertezas se avolumam, o país vai ficando inseguro e fragilizado. O que, nas actuais circunstâncias, pode ser dramático e pôr em causa o futuro. 

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